sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Sofrimento necessário

Como é difícil reconhecer uma derrota. Principalmente se for no campo do coração. Não era uma batalha com uma rival. De verdade, nunca houve espaço para mais ninguém. Nas lutas contra a rotina, a distância, o ciúme e os inúmeros caminhões de areia, nós conseguimos sobreviver usando artifícios poderosos como a poesia, as milhas do cartão de crédito, as conversas exaustivas, as risadas, a redundante dobradinha “verdade e cumplicidade” e tantas outras armas que nos fizeram tão propriamente “nós”.
Árduo é vencer a si mesmo. A insegurança sobre quem somos e como estamos, o mau-humor, o nervosismo, a pressa, a mágoa pelo que foi dito, a falta de paciência.
Todas as vezes que precisei me despedir de um relacionamento houve choro. Houve lamentação. E os remédios para tentar amenizar a dor e cicatrizar as feridas eram praticamente os mesmos: saída com os amigos, mudança do número de celular, aliás, total incomunicabilidade. E outras tantas medidas paliativas que na época, funcionavam.

Parece que o corpo desenvolveu imunidade. Não adianta mais usar os mesmos métodos. Dessa vez chegou a hora de encarar o sofrimento de frente. Com todas as lágrimas que ainda vão ensopar o travesseiro. Com a dor de cabeça do dia seguinte, por causa da congestão nasal. Com a cara inchada, perfeitamente disfarçada com a maquiagem canadense, que encobre as imperfeições da pele, mas não consegue devolver o brilho dos olhos.

Os conhecidos não se conformam com a minha decisão de viver o luto pela primeira vez. “Tão linda. Tão competente. Não merece sofrer por causa de homem”. Eu compartilho da opinião deles em alguns momentos em que a dor é tão grande que não extravasa apenas com o choro. Mas resolvi que talvez escrevendo sobre a dor seja mais fácil de vivenciá-la. Lendo sobre a dor, ela quem sabe, dê uma trégua. Vai passar. Todo mundo sabe que vai passar. Mas o período que divide o “vai” do “passou” muitas vezes é cruel.

“E como ela tem coragem de se revelar assim?” Alguns vão comentar, ou somente pensar. Simples: escrever sobre o que estou sentindo pode ser uma espécie de catarse. Meu processo de purificação.

Dois anos e dois meses que eu resumiria em uma palavra: coragem. Fomos fortes para enfrentar a distância, verdadeiros na hora de demonstrar as fraquezas, cúmplices para reconhecer que neste momento, as prioridades são diferentes. E apesar dessa dor que dilacera meu peito, sei que não seria justo continuar agora. A derrota é momentânea. Não vamos desistir nunca de defender nossas causas nesta guerra. Inclusive com nossas próprias vidas. Porém, somos inteligentes e sensíveis para reconhecer quando é necessário recuar.

A herança que você deixou foi ter me ajudado a descobrir o que há de melhor em mim. Foram as poesias compartilhadas. Os roteiros discutidos. A comida dividida no prato. A dança sem música. O tapete. Ah, o tapete. Nossa síndrome. Nosso símbolo. A música francesa. O número marcado na pele. A estrela de oito pontas. O seriado que agora virou meu vício. O vício abandonado.

Coisas boas e coisas ruins. Porque assim é a vida. Feita de paradoxos. De contradições. De crônicas e contos de fada. De prosa e de versos declamados com os dígrafos mais sonoros que meus ouvidos já captaram.

Meus cílios postiços estão encharcados enquanto escrevo esse desabafo. É a única coisa artificial que me permito usar, mas você sabe... É meu instinto maternal: são meus filhos! Fazer o quê?

Perdoe-me pelas eventuais crases perdidas ou mal empregadas. “Pelas frases tortas, embargadas pela tua ausência.”

Releve o sentimentalismo, as metáforas pobres. Meu coração está inundado. Mas minha alma sofre com a estiagem. É a falta do teu perfume. Mais clichê impossível seria se eu afirmasse que “falta um pedaço de mim”. Não falta mais. Faltava antes de te conhecer. Hoje estou inteira. E passo por esta fase temporária ou definitiva com a certeza de que uma grande história de amor não se encontra apenas nos livros. E que uma imagem via SMS vale mais do que muita declaração de amor.

Não poderia deixar o hábito de absorver o que você proporciona de tão bom. E termino esse post, imaginando um dia ser a Pilar do meu Saramago.

"O que as vitórias têm de mau é que não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que também não são definitivas." ( José Saramago )